• quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

    A “Rainha das Vias”

    A Via Ápia acompanhou a história de Roma através dos séculos, sendo o escoadouro das riquezas do comércio e o caminho das tropas em marcha. E, por fim, entrou para os anais da Igreja através de um dramático episódio: o “Quo Vadis”.
    “Todos os caminhos levam a Roma”, diz o velho provérbio latino. Com efeito, no apogeu da civilização romana, todo o mundo conhecido convergia, de alguma maneira, para a Cidade Eterna. Dali partiam as legiões conquistadoras, e para lá escoavam os tributos de lugares tão distantes e variados como Judeia, Britânia e Ibéria.
    Inovadores e metódicos, os romanos idealizaram diversos meios de manter a unidade dos seus domínios. Um deles foi a construção de inúmeras estradas para ligar a capital às províncias. Nisso revelaram-se excelentes engenheiros, pois muitas delas encontram-se ainda em bom estado, seguras e transitáveis.
    Entre estas, a mais famosa é a Via Ápia, também conhecida como Regina Viarum (Rainha das Estradas), que foi de fundamental importância estratégica para a supremacia de Roma nos primórdios da República. Sua construção iniciou-se no ano 312 a.C., por iniciativa de Appius Claudius Cæcus, censor da República e, mais tarde, cônsul. Pertencente a uma das mais antigas famílias patrícias, a Gens Claudia, esse homem perspicaz e empreendedor acabou por legar seu nome para a histórica estrada.
    O método utilizado na construção dessa obra-prima de engenharia é até hoje ponto de referência para obras do gênero. Sobre o caminho de terra, colocou-se uma camada de pedras com argamassa. Por cima dessa, assentou-se uma camada de cascalhos. Por fim, para formar uma superfície plana, um calçamento feito de lajes tão bem ajustadas umas às outras que, segundo se dizia, entre muitas delas não se conseguia introduzir a lâmina de uma faca. Para escoamento das águas pluviais, a Via Ápia era soerguida no meio e possuía canais em ambos os lados. Além disso, era protegida por meios-fios.
    A “Rainha das Estradas” acompanhou a história de Roma através dos séculos, sendo o escoadouro das riquezas do comércio e o caminho das tropas em marcha, fossem estas contra ou a favor da Cidade Eterna. Durante a Segunda Guerra Mundial, ela foi intensamente utilizada tanto pelo exército alemão como pelas forças aliadas, em ataques e contra-ataques na disputa pela posse da Península Itálica.
    Contudo, a histórica Via passou para os anais da Igreja através de um dramático episódio, conhecido como o Quo Vadis.
    A perseguição movida por Nero no primeiro século da Era Cristã havia sido de tal maneira terrível que o próprio São Pedro decidiu evadir-se de Roma. Segundo uma antiga tradição, ele caminhava pela Via Ápia quando, em determinada altura do trajeto, deparou-se com o próprio Jesus Cristo, que vinha em sentido contrário. Atônito, o Pescador de Homens caiu de joelhos diante de seu Mestre e Lhe perguntou:
    — Quo vadis Domine? (Para onde vais, Senhor?)
    — Vou a Roma, para ser crucificado mais uma vez...
    O Príncipe dos Apóstolos compreendeu: ante a fraqueza do discípulo que fugia do martírio, o Divino Mestre dirigia-se a Roma para morrer em seu lugar... Tomado de vergonha e arrependimento, São Pedro retornou à Urbe, onde foi martirizado algum tempo depois.
    No local do prodigioso encontro, ergueu-se no século IX uma pequena igreja, conhecida hoje pelo nome de Igreja do Domine Quo Vadis. Ela foi visitada pelo Servo de Deus João Paulo II no ano de 1983.
    Assim, as gastas e históricas pedras da Via Ápia são uma perene recordação da fragilidade do ser humano, mesmo quando dotado de um caráter extraordinário, como o do primeiro Pontífice. E são também marco simbólico do extremo de bondade e misericórdia de que o Divino Salvador é capaz, por amor a todos e cada um de nós.
    Revista Arautos do Evangelho · Janeiro 2009

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